segunda-feira, 11 de junho de 2012

JUSTIÇA GRATUITA - REVOGAÇÃO DE OFÍCIO - ADMISSIBILIDADE - NÃO É IMPRESCINDÍVEL O REQUERIMENTO DE REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO.

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
ACÓRDÃO
JUSTIÇA GRATUITA - Revogação de ofício - Admissibilidade - Não é imprescindível o requerimento de revogação do benefício - Se é regra de hermenêutica a que despreza a interpretação que leve ao absurdo, exigir-se que a revogação da gratuidade só pode ser reconhecida mediante provocação da parte contrária transformaria o juiz num robô - Assim como há o interesse público em conceder o benefício a quem dele necessite, a fim de garantir o acesso de todos à Justiça, também há interesse público em não admitir que quem não seja pobre se utilize indevidamente do privilégio - O autor, segundo a petição inicial, é professor universitário e percebia mensalmente (em dezembro de 2005) a soma líquida de R$ 4.597,85, correspondente naquela época a 15,32 salários mínimos - Além desses rendimentos, ele tem outros, como a receita que obtém como empresário e os subsídios vereador, fatos que a petição inicial não apontou e que não induzem à miserabilidade jurídica - Tais fatos, se afirmados naquela peça, certamente levariam o magistrado a não conceder de pronto o benefício pretendido - Juiz não revogou o benefício por revogar, mas baseou sua decisão na notoriedade dos fatos que indicou e que não foram contrariados - Manutenção da decisão que revogou de ofício a gratuidade processual - Recurso desprovido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 7.277.397-8, da Comarca de Jales, sendo agravante Rivelino Rodrigues e agravado Banco Santander Banespa S/A (Sucessor de Banco do Estado de São Paulo S/A).
ACORDAM, em Vigésima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, por votação unânime, negar provimento ao recurso.
1. Agravo de instrumento contra a decisão proferida em ação revisional de contrato bancário e que revogou de ofício o benefício da gratuidade processual concedida ao autor.
Recurso processado no efeito suspensivo, com resposta do agravado, sem requisição de informações ao juiz da causa.
2. O autor, ao aforar a ação, obteve o benefício da gratuidade processual (cf. fl. 59), não constando dos autos deste agravo que a matéria tivesse sido objeto de impugnação pelo Banco-réu.
Dispõe o art. 7° da Lei l.060/50:
"Art. 7°. A parte contrária poderá, em qualquer fase da lide, requerer a revogação dos benefícios de assistência, desde que prove a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão."
"Parágrafo único. Tal requerimento não suspenderá o curso da ação e se processará pela forma estabelecida no final do artigo 6º. desta Lei."
E o art. 8° acrescenta:
"Art. 8º. Ocorrendo as circunstâncias mencionadas no artigo anterior, poderá o juiz, ex-officio, decretar a revogação dos benefícios, ouvida a parte interessada dentro de quarenta e oito horas improrrogáveis."
A expressão "circunstâncias mencionadas no artigo anterior" significa prova da inexistência dos requisitos essenciais à concessão do benefício ou prova do desaparecimento dessas condições.
Não é imprescindível o requerimento de revogação do benefício, embora o dispositivo anterior trate do tema.
Se é regra de hermenêutica a que despreza a interpretação que leve ao absurdo, exigir-se que a revogação da gratuidade só pode ser reconhecida mediante provocação da parte contrária transformaria o juiz num robô, ou num crédulo por definição.
Como se vê, a interpretação literal levaria a um absurdo e, por ser a mais simples, normalmente não é a mais correta.
A jurisprudência do STJ admite a revogação de ofício da gratuidade processual.
"PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS À EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA - CONCESSÃO EM PRIMEIRO GRAU - REFORMA 'EX OFFICIO' PELO TRIBUNAL - APELAÇÃO JULGADA DESERTA - NECESSIDADE DE ABERTURA DE PRAZO PARA O RECOLHIMENTO DO PREPARO - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1 - Verificada a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais a concessão da assistência judiciária gratuita, admite-se a sua revogação, 'ex officio', pelo juiz, mas desde que ouvida a parte interessada, possibilitando-se a regularização do preparo, o que não ocorreu (nesse sentido, v.g. REsp 453.866/SP, Min. RUY ROSADO DE AGUIAR, DJ 10.02.2003). 2 - Recurso conhecido e provido para determinar que seja oportunizado ao recorrente manifestar-se acerca de sua atual condição econômica e, sendo o caso de sua alteração, seja-lhe oportunizado o recolhimento do preparo." [cf. REsp. 811.485-SP (2006/0010920-6), rel. Min. Jorge Scartezzini].
De mais a mais, é da doutrina que: "Pode o juiz denegar o benefício 'ex officio', independentemente da impugnação da parte contrária, se nos autos houver elementos suficientes para demonstrar a inexistência da situação de pobreza. Assim como há o interesse público em conceder o benefício a quem dele necessite, a fim de garantir o acesso de todos à Justiça, também há interesse público em não admitir que quem não seja pobre se utilize indevidamente do privilégio. Não pode o juiz, porém, negar a gratuidade sem que haja prova clara nesse sentido. O benefício só pode ser denegado de ofício se houver prova inequívoca de que o postulante não se ajusta ao perfil de beneficiário da gratuidade. Tal prova em contrário pode até mesmo decorrer das próprias afirmações da parte que requer o benefício. Porém, se não se puder extrair dos autos plena certeza do descabimento do pedido de gratuidade, na dúvida, deve o juiz conceder o benefício de plano, pois prevalece a presunção de veracidade da afirmação de pobreza. Além disso, antes de indeferir de plano, é conveniente que o juiz peça esclarecimentos à parte acerca dos fatos que lhe pareceram incompatíveis com a concessão da gratuidade, atendendo, com isso, ao princípio do contraditório." (cf. Augusto Tavares e Rosa Marcacini, Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça Gratuita, Forense, 2003, p. 103, apud A. I. 541.797-4/6-00, da 9ª Câmara de Direito Privado deste Tribunal de Justiça).
Pouco importa tivesse o autor obtido a gratuidade quando do ajuizamento da ação, pois isso decorreu da mera aceitação de suas afirmativas (que foram incompletas aliás). E tal aceitação pode ser revista a qualquer tempo, diante da constatação de dados que possam estar em contradição com a afirmada miserabilidade jurídica. Pode ser revogada à luz de dados concretos existentes nos autos, ou de esclarecimentos, além de feitura de alguma prova.
Confira-se, ademais, o que decidiu a 21ª Câmara de Direito Privado deste Tribunal em acórdão relatado pelo Des. Silveira Paulilo (cf. A. I. 7.082.063-6):
"Não se pode olvidar que a alteração legislativa que criou a presunção de pobreza mediante simples afirmação, veio num contexto de desburocratização, para facilitar o acesso à Justiça dos menos afortunados." ... "Há de se ter por bem claro o seguinte: não foi certamente a intenção do legislador, e nem isto resulta da melhor interpretação dos textos legais assinalados acima, impor credulidade absoluta ao juiz quando percebe, de antemão, que algo está errado, que pelo cotejar dos dados da inicial ou da qualificação da parte, não seria crível não poder ela suportar os ônus das custas e despesas processuais, inclusive honorários advocatícios." ... "Não se pode esquecer, também, que ao Juiz compete zelar pelo erário porquanto a Justiça é sustentada pelos tributos pagos pelo contribuinte, que, tanto quanto o juridicamente pobre, deve ser respeitado, mormente num País de escassos recursos oficiais."
Pois bem.
O autor, segundo consta da petição inicial, é professor universitário e percebia mensalmente (em dezembro de 2005) a soma líquida de R$ 4.597,85 (R$ 439,03 + R$ 4.158,82), correspondente naquela época a 15,32 salários mínimos.
E não é só.
Ele não impugnou neste recurso os fatos afirmados na decisão agravada e que, segundo o juiz, são de conhecimento comum: "...é pessoa conhecida na sociedade, ostenta excelente reputação no círculo social, no meio político, na área acadêmica, onde atua como professor universitário, tratando-se, ainda, de empresário e vereador à Câmara Municipal de Jales..." (cf. fl. 91).
Ora, se é assim, além daqueles rendimentos já referidos, ele tem outros, como a receita que obtém como empresário e os subsídios de vereador - fatos que a petição inicial não apontou e que não induzem à miserabilidade jurídica. Tais fatos, se afirmados naquela peça, certamente levariam o magistrado a não conceder de pronto o benefício pretendido e que foi corretamente revogado pelo posterior ato judicial recorrido.
Releva observar que o juiz não revogou o benefício por revogar. Baseou sua decisão na notoriedade dos fatos que indicou e que não foram contrariados neste agravo.
Convém deixar assentado, para não se alegar violação de dispositivos constitucionais e infra-constitucionais, que os benefícios da justiça gratuita são devidos a quem deles realmente necessita. Se o julgador tem elementos de convicção que destroem a declaração apresentada pela parte, deve negar o benefício, ou revogá-lo independentemente de impugnação do adversário.
Não obstante a gratuidade da justiça não se destine apenas aos miseráveis, pois abrange também os que não possam fazer frente aos custos de uma demanda sem prejuízo próprio ou de sua família, os requisitos daquele benefício, como se vê, não estão satisfeitos, por ser evidente que o autor reúne condições financeiras para custear o feito.
A benesse revogada pelo juiz (cuja restauração é pretendida neste agravo) não é instrumento geral e, sim, individual. Concedê-la benevolamente a qualquer um, que não seja realmente necessitado, contraria a lei e frustra a parte adversária, na legítima pretensão de se ver ressarcida das despesas antecipadas e dos honorários do seu advogado, bem como ao próprio Estado, que, afinal, cobra pela prestação jurisdicional porque entende necessária e devida a contraprestação dos jurisdicionados.
3. Negaram provimento ao recurso.
Presidiu o julgamento, com voto, o Desembargador LUIS CARLOS DE BARROS e dele participou o Desembargador CORREIA LIMA.
São Paulo, 8 de setembro de 2008.
ÁLVARO TORRES JÚNIOR
Relator
Fonte: Jornal Jurid Digital.

Um comentário:

  1. É UM TOTAL ABSURDO NO QUE ESTÃO TRANSFORMANDO O PODER JUDICIÁRIO. SENHORES MAGISTRADOS, O CIDADÃO BRASILEIRO PAGA UMA DAS MAIORES CARGAS TRIBUTÁRIAS DO PLANETA, QUE BEIRA 40% DO PIB, PARA QUE O PODER JUDICIÁRIO LEGISLE, E O MÍNIMO QUE ESPERA, É O CUMPRIMENTO DESTAS LEIS PELO PODER JUDICIÁRIO, NO CASO AS REGRAS ÓBVIAS DA LEI 1.050/50. CASO CONTRÁRIO, COMO PERCEBE DOS FUNDAMENTOS ACIMA, REALMENTE ESTAMOS VIVENDO NUMA GRAVE CRISE NA REPÚBLICA COM O DESCUMPRIMENTO DAS LEIS PELO MAGISTRADO, QUE LEGISLA EM CAUSA PRÓPRIA NA DEFESA DOS COFRES DO TRIBUNAL CONTRA OS INTERESSES NA SOCIEDADE. SOCORROOOO!!!!!!!!!!!!!!!

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