PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA
REGISTRADO(A) SOB N°
03855461
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e
discutidos estes autos de Apelação n° 0000125-15.2009.8.26.0240, da Comarca de
Rancharia, em que é apelante ALBERTO DE CAMARGO TAVEIRA, é apelado PREFEITURA
MUNICIPAL DE IEPE.
ACORDAM, em 18a Câmara de
Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "POR MAIORIA DE VOTOS, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O
RELATOR SORTEADO, QUE DECLARA. ACÓRDÃO COM A 2a JUÍZA.", de conformidade
com o voto do (a) Relator (a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a
participação dos Desembargadores OSVALDO CAPRARO (Presidente sem voto), BEATRIZ
BRAGA, vencedor, ROBERTO MARTINS DE SOUZA, vencido e CARLOS GIARUSSO SANTOS.
São Paulo, 14 de março de
2013.
BEATRIZ BRAGA
RELATORA DESIGNADA
Apelação sem Revisão n° 0000125-15.2009.8.26.0240
Voto n° 14928
Comarca: Rancharia
Apelante: Alberto de Camargo Taveira (embargante)
Apelado: Município de lei (embargado)
Juíza sentenciante: Luciana Menezes Scorza de Paula Barbosa
Ementa: Embargos à execução fiscal. Taxa de licença. Escritório de advocacia. Segundo entendimento
do STF, não é justificável a cobrança das taxas pelo exercício do poder de
polícia por mera natureza potencial. Dá-se provimento ao recurso.
Trata-se de apelação
contra sentença que julgou parcialmente procedentes os embargos à execução
fiscal opostos por Alberto de Camargo Taveira em face do Município de lepê
apenas para reconhecer a prescrição de parte do crédito executado (taxa de
licença, vencido em 20.10.02 a 20.12.02), com condenação do embargante ao
pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em
10% sobre o valor atualizado da dívida, (fls. 31/36).
Sustenta o apelante, em
síntese, para a cobrança da taxa de licença é imprescindível a materialização
do poder de polícia (fls. 39/44).
Contrarrazões (fls.
48/51).
É o relatório.
O recurso merece
provimento.
Entretanto, embora esta
subscritora já tenha se manifestado em sentido contrário, o Supremo Tribunal
Federal, em sessão plenária, ao julgar o RE 588.322/RO, de relatoria do Min.
Gilmar Mendes, sedimentou o entendimento de que não é justificável a cobrança
das taxas pelo exercício do poder de polícia por mera natureza potencial, assim
ementado: Recurso Extraordinário. 1, Repercussão geral reconhecida. 2. Alegação
de inconstitucionalidade da taxa de renovação de localização e de funcionamento
do Município de Porto Velho. 3. Suposta violação ao artigo 145, inciso II, da
Constituição, ao fundamento de não existir comprovação do efetivo exercício do
poder de polícia. 4. O texto constitucional diferencia as taxas decorrentes do
exercício do poder de polícia daquelas de utilização de serviços públicos
específicos e divisíveis, facultado a estas a prestação potencial do serviço
público. 5. A regularidade do exercício do poder de polícia é imprescindível
para a cobrança da taxa de localização e fiscalização. 6. (...). Recurso
extraordinário ao qual se nega provimento.
Extrai-se de seu voto
condutor que "embora inegável sua essência de serviço público - o
exercício do poder de polícia possui uma característica singular, relevante
para o ramo do direito tributário: é exercido em benefício primordial da
coletividade, não do fiscalizado.
Em outras palavras, a
fiscalização incidente sobre qualquer atividade particular não se destina ao
estabelecimento isoladamente considerado, mas a todos os administrados que
serão indistintamente beneficiados pelo agir da administração pública, ou seja,
o serviço do poder de polícia tem o objetivo precípuo de acautelar a
coletividade. (...)
Daí não ser justificável
sua cobrança por mera natureza potencial, ao contrário dos serviços específicos
e divisíveis. De fato,
o exercício do poder de polícia deverá ser efetivo e
concreto, em razão de sua natureza de serviço público profilático, exercido em
prol da coletividade."
No caso, o embargante
argumenta na inicial que não houve fiscalização por parte do executado. Dada,
inclusive, a impossibilidade de produção de prova negativa, competiria ao
Município provar que efetuou a atividade fiscalizatória que ensejou a cobrança
da taxa, o que não o fez. Logo, indevida sua cobrança.
Por fim, para viabilizar
o acesso aos Tribunais Superiores consideram-se prequestionadas as questões
deduzidas e imprescindíveis à solução do caso, uma vez que, dirimida a
controvérsia, tem-se como desnecessária a citação numérica de dispositivos de
lei, conforme entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça (EDcl no RMS
18205/SP, Min. Felix Fischer, DJ 8.5.2006).
Ante o exposto, dá-se
provimento ao recurso para afastar-se a cobrança da taxa de licença, com a
conseqüente procedência dos embargos à execução fiscal e inversão da verba
sucumbencial.
BEATRIZ BRAGA
Relatora
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
Com a devida vênia, ouso
divergir da douta maioria, entendendo que o recurso deveria ser desprovido, em
conformidade com julgamentos dos quais participei, considerando que, segundo
minha ótica, o exercício do poder de polícia é indispensável, sendo que a
existência do aparato administrativo pressupõe o efetivo exercício do poder de
polícia, sendo desnecessária a comprovação in locu da fiscalização do
estabelecimento.
Trata-se de apelação
interposta por Alberto de Camargo Taveira contra a r. sentença de fls.31/36,
que acolheu parcialmente os embargos opostos à execução fiscal movida pela
Prefeitura Municipal de Iepê, em razão de créditos oriundos de taxa de licença
dos exercícios de 2002 a 2005, no valor de R$ 529,81, para declarar prescritos
os débitos relativos ao exercício de 2002 e manter válida as demais exações
constantes das CDA's de fls.5/6 do apenso, sob fundamento de serem legalmente
devidas.
O apelante alega nas
razões recursais (fls.39/44) a ilegalidade da cobrança da referida taxa de
licença, pois o fato gerador enseja o exercício regular do poder de polícia ou
a utilização efetiva do serviço público, e a Municipalidade não exercitou tal
poder, deixando de apresentar a contraprestação do serviço.
O recurso foi recebido
(fls.46) e processado, com contrarrazões, fls. 48/51.
O reclamo não mereceria
provimento.
Trata-se de execução fiscal
proposta pela Fazenda do Município de Iepê, em razão de créditos tributários
relativos à taxa de licença dos exercícios de 2002 a 2005 (conforme CDA de fls.
5/6).
Primeiramente, com a
devida vênia, a sentença merece reparo quanto à questão da prescrição dos
créditos relativos ao exercício de 2002.
Tendo em vista que a
presente ação foi distribuída em 29/12/2006 (cf. fls. 1), ou seja, em data
posterior à vigência da LC n° 118/05, que alterou o inciso I, do parágrafo
único, do art. 174 do CTN, interrompe-se a prescrição com o despacho do juiz
que determina a citação.
Ocorre que, proposta a
execução na vigência da LC n° 118/05, em vigor a partir de 09 de junho de 2005,
deve ser aplicado o disposto no art. 219, § 1º, do CPC: "A interrupção da
prescrição retroagirá à data da propositura da ação”.
Desse modo, a despeito de
o despacho que determinou a citação datar de 29/01/2007, deve ser aplicado o
§1°, do art. 219, do CPC, retroagindo a data da interrupção do prazo prescricional
(art. 174, do CTN) para 29/12/2006 (cf. fls. 02 - apenso), data da propositura
da ação.
Dessa forma, a contar de
29/12/2006 verifica-se não ter ocorrido, com a devida vênia, a prescrição dos
créditos relativos ao exercício de 2002, posto não ter decorrido o prazo
qüinqüenal do art. 174, do CTN.
No mérito, andou bem a r.
sentença, pois a taxa de licença cobrada não padece dos vícios alegados pelo
apelante, principalmente no que toca à alegada necessidade de materialização do
poder de polícia e efetiva contraprestação de serviço.
Ao contrário, a taxa de
licença instituída pela Municipalidade de lepê está em prefeita consonância com
o art. 145, II, da CF, bem como com o art. 77, do CTN, que assim dispõem,
respectivamente: "Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(...)
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou
pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição".
"Art. 77. As taxas cobradas
pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito
de suas respectivas atribuições, têm como foto gerador o exercício regular do
poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público
específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.'*
Aliás, a jurisprudência
colacionada pelo apelante é ultrapassada, sendo que o atual entendimento
firmado pelos nossos tribunais vai de encontro ao mencionado nas razões
recursais.
A taxa de fiscalização e
funcionamento de atividade figura-se legal, não podendo sua cobrança ser
excluída, mesmo no caso de renovação anual.
Assim tem decidido o
Superior Tribunal de Justiça, desde a revogação da Súmula 157 pela Primeira
Seção da Corte, em 24/042002, conforme publicação do DJU de 07/05/2002.
"TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
TAXA DE FISCALIZAÇÃO, LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA.
LEGALIDADE. CANCELAMENTO DA SÚMULA N. 157/STJ.
1. Afigura-se legítima a cobrança
pelo município de taxa de fiscalização, localização e funcionamento de
escritórios de advocacia.
2. Modificação de entendimento do
Superior Tribunal de Justiça efetivada com o cancelamento da Súmula n. 157/STJ.
3. Recurso especial não-provido. (REsp.
431.391/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em
01/06/2006, DJ 02/08/2006, p. 235)".
Esta Corte já teve
oportunidade de se pronunciar do seguinte modo:
"Apelação. Mandado
de segurança. Taxa de licença para localização, instalação e funcionamento.
Exercícios de 1999 a 2001. Reconhecimento de ilegitimidade da exação.
Inadmissibilidade. Exercício do poder de polícia. Possibilidade de renovação
anual da cobrança. Base de cálculo que leva em conta a natureza da atividade do
contribuinte. Relação com o custo do exercício do poder de polícia. Precedentes
do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e desta Corte.
Recurso provido". (Apelação 008847615.2003.8.26.0000. TJ/SP. 14a Câmara de
Direito Público. Rei. Des. Geraldo Xavier, j . em 06/10/2011). - grifei.
Alias, sob a minha ótica,
renovadas vênias ao entendimento da douta maioria, o entendimento atual do
Supremo Tribunal Federal sobre o tema é no sentido de que é sim necessária a
comprovação do efetivo exercício do poder de polícia, mas tal comprovação se dá
pela demonstração da existência de órgão e estrutura competentes para o
respectivo exercício e não pela comprovação da fiscalização empreendida in
locu, no caso concreto, como entendeu a Douta maioria julgadora.
Aliás, da leitura integral
da ementa do Recurso Extraordinário 588.322/RO, em 16/06/2010, de relatoria do
Min. Gilmar Mendes, pelo Tribunal Pleno daquela Corte, com Repercussão Geral
Reconhecida, que externalizou referido entendimento, não se pode inferir outra
ilação se não a de que é constitucional a cobrança das taxas de "desde que
efetivo o exercício do poder de polícia, demonstrado pela existência de órgão e
estruturas competentes para o respectivo exercício".
É conferir:
Recurso Extraordinário. 1.
Repercussão geral reconhecida. 2. Alegação de inconstitucionalidade da taxa de
renovação de localização e de funcionamento do Município de Porto Velho. 3.
Suposta violação ao artigo 145, inciso II, da Constituição, ao TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DE SÃO PAULO poder de policia. 4. O texto constitucional diferencia as
taxas decorrentes do exercício do poder de polícia daquelas de utilização de
serviços específicos e divisíveis, facultando apenas a estas a prestação
potencial do serviço público. 5. A regularidade do exercício do poder de
polícia é imprescindível para a cobrança da taxa de localização e fiscalização.
6. A luz da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, a existência do
órgão administrativo não é condição para o reconhecimento da constitucionalidade
da cobrança da taxa de localização e fiscalização, mas constitui um dos
elementos admitidos para se inferir o efetivo exercício do poder de polícia,
exigido constitucionalmente. Precedentes. 7. O Tribunal de Justiça de Rondônia
assentou que o Município de Porto Velho, que criou a taxa objeto do litígio, é
dotado de aparato fiscal necessário ao exercício do poder de polícia. 8.
Configurada a existência de instrumentos necessários e do efetivo exercício do
poder de polícia. 9. É constitucional
taxa de renovação de funcionamento e localização municipal, desde que efetivo o
exercício do poder de polícia, demonstrado pela existência de órgão e estrutura
competentes para o respectivo exercício, tal como verificado na espécie
quanto ao Município de Porto Velho/RO 10. Recurso extraordinário ao qual se
nega provimento, grifei.
De fato, uma leitura
descontextualizada de trechos isolados da ementa poderia eventualmente levar a
crer que somente seria constitucional a cobrança da taxa se comprovada in locu a fiscalização do
estabelecimento.
Contudo, a logidicidade
do raciocínio que embasa a tese referendada pelo STF é no sentido de que o
exercício do poder de polícia é Apelação sem Revisão n. 0000125-15.2009.8.26.0240
indispensável, sendo que a existência do aparato administrativo pressupõe o
efetivo exercício do poder de polícia.
A questão do aparato fiscalizatório
estatal deverá ser analisada caso a caso, sendo fato notório que para a
fiscalização de um pequeno escritório de advocacia não se faz preciso grande
aparato municipal, quanto mais em um Município de pequeno porte como o apelado,
cuja população total é de 7.487 (sete mil quatrocentas e oitenta e sete) pessoas,
conforme dados obtidos em http://www.iepe.sp.gov.br. acesso em 13/03/13.
Diferente, portanto,
fosse o caso de se fiscalizar uma grande empresa em uma metrópole.
Ante o exposto, pelo meu
voto, negar-se-ia provimento ao recurso, reformando-se a sentença tão somente
quanto aos créditos do exercício de 2002, os quais não estão prescritos,
devendo a execução prosseguir quanto a todos os créditos contidos nas CDA's de
fls.5/6.
Roberto Martins de Souza
Relator sorteado vencido